Hipertrofia: Ir até a falha ou não?



Para quem procura a hipertrofia muscular, sempre foi indicado que se treinasse até a falha para produzir melhores ganhos, onde recrutaríamos mais unidades motoras a medida que alcançássemos a fadiga neuromuscular, sendo definida pelo Princípio do Tamanho (1), que diz que unidades motoras menores são recrutadas antes, seguidas de unidades motoras maiores, assim fibras musculares lentas seriam recrutadas primeiro, e só depois as fibras musculares rápidas, que possuem maior capacidade de hipertrofia, seriam recrutadas (2,3).

Entretanto, tem sido especulado que unidades motoras de limiar de excitabilidade mais altas, compostas predominantemente de fibras musculares rápidas, são recrutadas quando as repetições são realizadas até a falha, possivelmente devido à fadiga nas unidades motoras (4). Treinar até a falha promove uma atividade eletromiográfica aumentada, o que sugere um aumento do recrutamento de unidades motoras com maior limiar de excitabilidade (5).

Porém devido ao grande número de inervações entre as unidades motoras que compõem um único músculo, pode haver má interpretação destes sinais de eletromiografia, e que não é apropriado categorizar as unidades motoras como sendo responsáveis por fibras musculares mais lentas ou mais rápidas (6). Embora, apesar de ser um raciocínio lógico, não fica claro se treinar até a falha é realmente necessário para conseguir ter uma maior ativação muscular (7). 

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Resultados para a Hipertrofia

No estudo de Sampson et al. (8), o objetivo foi determinar o efeito do treinamento até a falha na adaptação muscular funcional, estrutural e neural dos flexores do cotovelo. No protocolo de treino, o grupo controle realizava repetições até a falha em uma cadência de 2” para 2”, o segundo grupo realizava repetições com fase concêntrica mais rápida e o terceiro grupo realizava de maneira balística, com fase concêntrica e excêntrica rápidas, sendo para estes dois últimos sem atingir a falha. Os resultados mostraram que ocorreram adaptações semelhantes entre os três regimes de treinamento sugerindo que treinar até a falha não é crítico para provocar mudanças neurais e estruturais significativas no músculo. Ainda assim, o grupo que treinou até a falha teve, o volume de treino, o tempo sobre tensão e o nível de percepção de esforço maiores, ou seja, foi realizado mais trabalho, para praticamente o mesmo resultado.

Outro estudo (9) comparou grupos que treinavam com alta (80% 1RM*) ou baixa (30% 1RM) intensidade e atingindo ou não a falha e após 12 semanas, foram apresentadas taxas semelhantes de hipertrofia muscular em ambos os grupos, mostrando que tanto o grupo que treinava até a falha quanto o grupo que parava as repetições antes, foram igualmente efetivos no aumento da força e da hipertrofia muscular, independente da intensidade de 80% ou 30% de 1RM.

A razão do treino até a falha está relacionada com a alteração do recrutamento das unidades motoras e pode ser melhor entendido quando comparando intensidades de treino diferentes (10), onde as demandas de força (alta ou baixa) requerem diferentes números de unidades motoras para o mesmo músculo e quando se treina até a falha com uma intensidade mais baixa, o total de volume de treino se torna maior, sendo assim uma maior quantidade de trabalho realizada (11), assim o volume de treinamento produz uma contribuição significante para as adaptações de força e hipertrofia, independente da especificidade da faixa de repetições (12). 

Aplicações práticas

Geralmente quando se treina até a falha, leva-se mais tempo para que ocorra a recuperação muscular, com isso terá uma capacidade reduzida para treinar o mesmo grupo muscular em um próximo treino, devido diminuição de força e potência, alteração no recrutamento de fibras como já falamos aqui. Mesmo que você faça rotinas de treino de um grupo muscular por semana, você ainda sai perdendo, pois já foi demonstrado que maior frequência semanal pode elevar mais os resultados (13).  

Portanto se você pode treinar mais vezes o mesmo grupo muscular na semana, acarretando um maior volume semanal de treino neste grupo, pode ser que treinar sempre até a falha não seja uma boa opção, já que com um maior volume de treinamento se alcança melhores resultados em relação a força e hipertrofia muscular. Para isso, é necessário uma boa periodização, onde se terão momentos em que treinar até a falha será importante, porém nem sempre.

*1RM – Uma repetição máxima: Se por exemplo, o máximo de peso que você pode levantar é 80kg, isso é considerado sua 1RM, portanto 80% de 1RM seria 64kg.

Referências

1.          Henneman E. Relation between Size of Neurons and Their Susceptibility to Discharge. Science (80- ). 1957;126(December):13–451347.

2.          Zatsiorsky VM, Kraemer WJ. Science and Practice of Strength Training. 2o Edition. United States: Human Kinetics; 2006. 251 p.

3.          Ogborn D, Schoenfeld BJ. The Role of Fiber Types in Muscle Hypertrophy : Implications for Loading Strategies. Strength Cond J. 2014;36(2):20–5.

4.          Willardson J. The application of training to failure in periodized multiple-set resistance exercise programs. J Strength Cond Res. 2007;21(2):628–31.

5.          Akima H, Saito A. Activation of quadriceps femoris including vastus intermedius during fatiguing dynamic knee extensions. Eur J Appl Physiol. 2013;11(113):2829–40.

6.          Enoka RM, Duchateau J. Inappropriate interpretation of surface EMG signals and muscle fiber characteristics impedes understanding of the control of neuromuscular function. 2015;(2):1516–8.

7.          Nóbrega SR, Libardi CA. Is Resistance Training to Muscular Failure Necessary ? Front Physiol. 2016;7(January):75–8.

8.          Sampson JA, Groeller H. Is repetition failure critical for the development of muscle hypertrophy and strength ? Scand J Med Sci Sports. 2015;1–9.

9.          Nóbrega S, Ugrinowitsch C, Pintanel L, Barcelos C, Libardi C. Effect of resistance training to muscle failure versus volitional interruption at high- and low-intensities on muscle mass and strength. J Strenght Cond Res. 2018;1(32):162–9.

10.       Burd NA, Mitchell CJ, Churchward-venne TA, Phillips SM. Bigger weights may not beget bigger muscles : evidence from acute muscle protein synthetic responses after resistance exercise. 2012;554:551–4.

11.       Burd NA, West DWD, Staples AW, Atherton PJ, Baker JM, Daniel R, et al. Low-Load High Volume Resistance Exercise Stimulates Muscle Protein Synthesis More Than High-Load Low Volume Resistance Exercise in Young Men. 2010;5(8).

12.       Klemp A, Dolan C, Quiles JM, Blanco R, Zoeller RF, Graves BS, et al. Volume-equated high- and low-repetition daily undulating programming strategies produce similar hypertrophy and strength adaptations. Appl Physiol Nutr Metab [Internet]. 2016;41(7):699–705.

13.       Schoenfeld BJ, Ratamess NA, Peterson MD, Contreras B, Tiryaki-Sonmez G. Influence of resistance training frequency on muscular adaptations in well-trained men. J Strength Cond Res. 2015;29(7):1821–9.

2 thoughts on “Hipertrofia: Ir até a falha ou não?”

  1. Por favor, a respeito de qual é a quantidade ( n¤ mínimo) de séries e repetições, que propiciarão estímulos musculares, que degradem, a respeito das suas fibras, efetivamente, a partir de qual carga/peso?

    Eu cogitei, a respeito do mesmo, a partir da estrutura cronolódomica do minuto:

    Séries (x): 6 (10%);
    Repetições (s): 15 (25%)

    1. scitraining says:

      Olá Leonardo.
      O volume de treino (Séries e Repetições) pode ser variável, revisão sistemática do Schoenfeld já procurou verificar qual seria a dose-resposta do número de séries semanais para a melhora da hipertrofia, que também é distinto para indivíduos treinados e não-treinados. Nesta revisão ele conclui que pelo menos 10 séries semanais são necessárias para maximizar os ganhos de massa muscular, mesmo assim também tem sido demonstrado que até 5 séries semanais podem causar o aumento da hipertrofia.

      Em relação a carga/peso, é relativo ao percentual de 1RM, onde já foi mostrado que cargas de 30% 1RM podem causar hipertrofia, porém obviamente será necessário um maior número de repetições para causar estímulos suficientes para ocorrer mudanças estruturais. É variável em relação ao objetivo: Resistência de Força menor que 50-60% aproximadamente; Força Máxima maior que 60-70% aproximadamente.

      Nosso texto busca apresentar que ao invés de fazer séries até a falha muscular (o que pode causar demorada recuperação), é possível realizar séries com “reserva”, dessa forma sendo possível realizar mais sessões de treino e um maior volume de treino em um determinado tempo (uma semana, por exemplo). Assim o aumento da frequência semanal de treinos é uma boa estratégia para melhoras de força e hipertrofia.

      Espero ter ajudado.

      Att,
      Gustavo
      SciTraining

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