Treinamento de Core pode não melhorar desempenho físico, mas pode prevenir lesões



É comum vermos treinadores prescrevendo treinamento de Core para atletas ou alunos de várias modalidades esportivas, sob várias justificativas. Dentre elas estão a melhoria da performance e a prevenção de lesões. Mas será que é possível melhorar o desempenho físico com o treinamento de Core? Treinar Core pode prevenir lesões?

O termo Core

Na comunidade esportiva, se tem praticado exercícios voltados para o desenvolvimento do “Core” o qual pode ser definido pelos conceitos de estabilidade e de força. Quando o termo Estabilidade do Core é usado, este é referenciado à estabilidade da coluna e não dos próprios músculos, e quando o termo Força do Core é usado, está referido a capacidade dos músculos de estabilizar a coluna através de forças contráteis e pressão intra-abdominal (1). Isso difere pela razão dos exercícios possuírem um limiar, sendo cargas mais baixas relacionadas à estabilidade, na qual o treino melhoraria a capacidade de coordenação muscular pelo sistema nervoso central e também a eficiência do movimento, e cargas mais altas relacionadas a força, produzindo mudanças na estrutura muscular (2).
Teoricamente, o treinamento da força e estabilidade do Core irá levar a melhor potência máxima e mais eficiência no uso dos músculos dos ombros, braços e pernas, melhor equilíbrio corporal e menor risco de lesões (3). Acredita-se que um Core fraco cause alterações na transferência de energia, resultando em redução do desempenho atlético e risco de lesão em um grupo muscular fraco ou subdesenvolvido. Portanto, há uma suposição de que um aumento na força do Core resultará no aumento do desempenho esportivo (4).

O que a ciência diz?

Alguns estudos têm mostrado que realizar exercícios para o desenvolvimento do Core não traz melhor desempenho no resultado esportivo (3,5–8). Existe também pouca correlação com a força e a potência (4), além disso treinar em superfícies instáveis tem limitações quanto aos ganhos comparados em superfícies estáveis, quando relacionado a força máxima (9,10). Foi analisado também que o uso de pesos livres se sobressai sobre o de outros equipamentos como bolas, pranchas de equilíbrio, quando se pretende melhorar a ativação muscular (11,12).
Esses resultados podem estar relacionados a não especificidade dos testes utilizados para avaliar sua eficácia. Geralmente os testes para avaliar o desempenho do Core são realizados de forma estática (Como maior tempo de execução em uma prancha frontal Isométrica), o que não possui uma grande transferência quando comparado com movimentos dinâmicos e mais explosivos como saltos, tiros de velocidade e testes de uma repetição máxima, assim demonstrando não possuir grande relação com o desempenho (4).
Exercícios de prancha são considerados adequados para que atletas melhorem a força do Core, porém estes exercícios colocam o praticante em posição estática, o que não é funcional ou específico para a maior parte dos esportes (13). As demandas do desempenho esportivo exigem movimentos dinâmicos, os atletas competem de forma dinâmica e devem ser treinados da mesma forma (13).
O treinamento de força geral traz benefícios para os atletas devido seu potencial de aumentar as capacidades do músculos de gerar força, reduzir o risco de lesões e melhorar a estabilidade do Core. Entretanto para que a transferência seja maximizada o treinamento deve ser o mais específico possível especialmente em relação ao padrão de movimento e a velocidade de execução do movimento (14) Contudo, esta falta de efeito no desempenho pode ser devido aos programas não serem específicos o suficiente para transferir as melhoras no desempenho esportivo (2).

Risco de lesões

Os exercícios que recuperam e melhoram a estabilidade do Core são relacionados com reabilitação e prevenção de lesões (15). Apesar dos estudos não demonstrarem ganhos a respeito de velocidade, potência e força, os autores concordam quanto a resultados positivos à diminuição do risco de lesões (2,3,5,6,12,16,17) podendo ser que as melhoras na força e estabilidade do core apenas impactam indiretamente no desempenho esportivo, por permitir que atletas treinem livres de lesões por mais tempo (2). Para se alcançar um bom desempenho é necessário reduzir o número de lesões. Quanto menos lesões, mais tempo aprimorando suas habilidades.

Desempenho físico

Os efeitos positivos do treinamento do Core no desempenho físico podem ser explicados pelo papel específico do tronco na ligação com as extremidades. Particularmente com movimentos rotacionais do torso, os músculos do tronco geram torque ao longo de um caminho para aumentar a produção de força nas extremidades (18). Um core forte transferirá as forças com mínima perda de energia.(13). Como pode ser visto em exercícios com abordagens multifacetadas, que direcionam o movimento nos 3 planos de movimento, combinando, desde exercícios com Medicine Ball, até levantamento de peso olímpico, que podem prover melhoras biomecânicas e fisiológicas em relação ao core, podendo melhorar o desempenho na maioria dos esportes(19).
Ainda assim, alguns estudos demonstraram que o treinamento de Core de forma isolada também acarretou em melhora dos resultados em relação a endurance, força e equilíbrio, sendo nestes casos as intervenções realizadas com pessoas pouco treinadas (20–23). As vantagens disto são relacionadas ao uso de cargas menores, especialmente em caso onde se tem uma lesão, na redução da monotonia devido uma maior variabilidade dos exercícios e de estímulos, o que pode promover uma motivação maior no praticante.

Concluindo

Portanto, de acordo com o que os estudos dizem, podemos concluir que o treinamento de Core, de forma inespecífica, pode não melhorar o rendimento esportivo, mas nem por isso ele não traz benefícios. A redução do risco de lesões é um dos fatores mais importantes para o esporte. O atleta que passa mais tempo em quadra treinando, aprende, se desenvolve e rende mais. Com isso afeta indiretamente no resultado esportivo.

Fontes

1. Faries MD, Greenwood M. Core Training : Stabilizing the Confusion. Strenght Cond J. 2007;29(2):10–25.
2. Hibbs AE, Thompson KG, French D, Wrigley A, Spears I. Optimizing Performance by Improving Core Stability and Core Strength. Sport Med. 2008;38(12):995–1008.
3. Tse M, McManus A, Masters R. Development and Validation of a Core Endurance Intervention Program: Implication for Performance in College-Age Rowers. J Strength Cond Res. 2005;19(3):547–52.
4. Nesser TW, Huxel KC, Tincher JL, Okada T. The Relationship Between Core Stability and Performance in Division I Football Players. J Strength Cond Res. 2008;22(6):1750–4.
5. Stanton R, Reaburn P, Humphries B. The Effect of Short-term Swiss Ball Training on Core Stability and Running Economy. J Strength Cond Res. 2004;18(3):522–8.
6. Clark A, Goedeke M, Namvong R, Rockwell D, Lehecka B, Manske R, et al. Effects of Pelvic and Core Strength Training on High School Cross-Country Race Times. J Strength Cond Res. 2017;31(8):2289–95.
7. Okada T, Huxel KC, Nesser TW. Relationship Between Core Stability, Functional Movement and Performance. J Strength Cond Res. 2011;25(1):252–61.
8. Ozmen T, Aydogmus M. Effect of Core Strength Training on Dynamic Balance and Agility in Adolescent Badminton Players. J Bodyw Mov Ther [Internet]. 2016;20(3):565–70. Available at:http://dx.doi.org/10.1016/j.jbmt.2015.12.006
9. Behm DG, Muehlbauer T, Kibele A, Granacher U. Effects of Strength Training Using Unstable Surfaces on Strength , Power and Balance Performance Across the Lifespan : A Systematic Review and Meta-analysis. Sport Med. 2015;45(12):1645–69.
10. Granacher U, Schellbach J, Klein K, Prieske O, Baeyens J, Muehlbauer T. Effects of core strength training using stable versus unstable surfaces on physical fitness in adolescents : a randomized controlled trial. BMC Sports Sci Med Rehabil. 2014;6(40):1–11.
11. Martuscello JM, Nuzzo JL, Ashley CD, Campbell BI, Orriola JJ, Mayer JM. Systematic Review of Core Muscle Activity During Physical Fitness Exercises. 2013;27(6):1684–98.
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13. Shinkle J, Nesser TW, Demchak TJ, McMannus DM. Effect of Core Strength on the Measure of Power in the Extremities. J Strength Cond Res. 2012;26(2):373–80.
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18. Granacher U, Prieske O, Majewski M, Muehlbauer T. The Role of Instability with Plyometric Training in Sub-elite Adolescent Soccer Players. Int J Sports Med. 2015;36(5):386–94.
19. Judge LW. Core Training for Superior Sports Preparation. J Coach Educ. 2008;1(2):38–63.
20. Sato K, Mokha M. Does Core Strength Training Influence Running Kinetics, Lower-Extremity Stability, and 5000-M Performance in Runners? J Strength Cond Res. 2009;23(1):133–40.
21. Weston M, Hibbs AE, Thompson KG, Spears IR. Isolated Core Training Improves Sprint Performance in National-Level Junior Swimmers. Int J Sports Physiol Perform. 2015;10(2):204–10.
22. Sparkes R, Behm DG. Training Adaptations Associated with an 8-Week Instability Resistance Training Program with Recreationally Active Individuals. J Strength Cond Res. 2010;24(7):1931–41.
23. Kibele A, Behm DG. Seven Weeks of Instability and Traditional Resistance Training Effects on Strength, Balance and Functional Performance. J Strength Cond Res. 2009;23(9):2443–50.

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