Dentre as inúmeras dúvidas que surgiram durante a pandemia, usar ou não a mascara durante o exercício é mais uma que parece não ter muita solução. A recomendação feita pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em junho deste ano foi de que as pessoas NÃO usem mascara durante o exercício, devido poder reduzir a capacidade de respirar confortavelmente, além de que o suor deixará a máscara molhada, tornando ainda mais difícil respirar e promovendo a proliferação de outros microrganismos (Confira abaixo a promoção realizada pela OMS).
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Apesar disto, em muitos lugares ainda é recomendado que seja feito o uso de máscara, juntamente a manter o distanciamento adequado como medida preventiva para evitar a proliferação do coronavírus. Seria então o uso de máscara durante o exercício prejudicial a saúde?
Usar máscara faz mal?
Algumas especulações surgiram, como a de que usar máscara durante o exercício faz mal, sendo a justificativa embasada na questão da inalação do dióxido de carbono exalado da respiração, que acabaria por desenvolver hipercapnia, que é o aumento do dióxido de carbono no sangue, causando, portanto, uma acidose respiratória. Dentre os principais sintomas estão a taquicardia, dispneia, dores de cabeça, tonturas, confusão (1).
Apesar disso, estudos mostraram que o uso de máscaras durante o exercício ou em condições de baixa intensidade não desenvolvem a condição. Foi analisada a atividade de caminhada em esteira a 5.6km/h por 1 hora em sujeitos usando e não usando máscara do tipo cirúrgica, e apesar de ocorrer um aumento de variáveis como a frequência cardíaca, taxa respiratória e na quantidade de CO2 presente no sangue, não houve diferenças significativas quando comparados os sujeitos com ou sem o uso da máscara, não sendo associado ao desconforto ou esforço durante a atividade (2,3). Em relação à saturação de oxigênio e dióxido de carbono também não houveram mudanças clinicamente significativas (2). Os autores dos estudos afirmam ainda que estas alterações fisiológicas geralmente devem ser bem toleradas por pessoas saudáveis.
Outro estudo também encontrou que uso de máscaras cirúrgicas podem causar o aumento da dispneia durante o exercício, porém não ocorre alterações quando novamente em repouso. Os autores assumem que uma das limitações do estudo foi deixar de levar em consideração a frequência respiratória e que talvez pudesse ter fornecido informações sobre um possível fenômeno de hiperventilação associado ao uso da máscara, uma vez que a frequência respiratória aumenta em média 1,6 ciclos por minuto com o uso dessa máscara e que foi correlacionado com a sensação de dispneia. No entanto, afirmam os autores, que a repercussão de tal aumento parece clinicamente insignificante (4).
Baseados nestes estudos supracitados, foi portanto levantada a hipótese de que existe um risco a saúde ao se exercitar com máscara, em relação as alterações fisiológicas (1), porém como visto, ao ponto de vista clínico e sem significância estatística, estas alterações podem ser toleradas pelo organismo de indivíduos saudáveis . Os autores afirmam que mesmo com o uso de máscara protetora, o distanciamento social durante a prática de exercícios ao ar livre é essencial e que para evitar os efeitos adversos do exercício com máscara, o indivíduo deve primeiro estar ciente de seu limite de exercício.
Saudáveis x Não-Saudáveis
Em sujeitos saudáveis, o exercício aeróbico com máscara se mostra uma possibilidade segura, apesar de poder estar associado com algum desconforto, o uso da máscara tem poucos efeitos nos parâmetros fisiológicos durante o exercício. Sujeitos com doença obstrutiva pulmonar crônica ou asma, e doenças cardíacas devem passar por avaliação meticulosa antes de realizarem atividade física com máscara (5).
Entanto, é plausível que para atletas que se exercitam intensamente por períodos prolongados, especialmente usando máscaras excessivamente apertadas, pode haver risco fisiologicamente significante de hipercapnia e hipóxia, devendo essa hipótese ser urgentemente testada (6).
Exercícios de intensidade baixa a moderada seriam benéficos e ajudariam a reduzir os efeitos nocivos da respiração com máscara. Ao experimentar sintomas de tontura, desequilíbrio, fadiga excessiva e falta de ar, é aconselhável parar e tomar uma pausa, até que os sintomas diminuam. A respiração intermitente, sem a máscara, seria benéfica para restaurar a normalidade da respiração e reduzir o estresse no sistema cardiopulmonar, em uma área não densamente ocupada por pessoas. Pessoas com doenças crônicas devem evitar aventurar-se ao ar livre para fazer exercícios. Exercícios domiciliares, realizados sob a supervisão de um profissional de saúde, seriam preferíveis para evitar quaisquer resultados adversos (1).
Conclusão… e opinião!
Visto que provavelmente os malefícios não superam os benefícios (proteção contra a infecção do coronavírus), não há dados suficientes que possam assumir que exercitar-se de máscara faz mal a saúde. A maior parte dos estudos tem uma amostra experimental com poucos sujeitos, não podendo os resultados serem extrapolados. Entretanto, as recomendações apontam que para indivíduos com algum tipo de doença pulmonar pode haver algum risco relacionado aos sintomas fisiológicos do exercício com máscara e, portanto, para evitar maiores riscos o indicado é exercitar-se em isolamento, sem a necessidade do uso de máscara.
Para pessoas saudáveis, exercícios de baixa e moderada intensidade com máscara não demonstram risco fisiológico, portanto ao praticar exercícios ou atividade física ao ar livre, seria prudente a prática com máscara. Exercícios de mais alta intensidade usando máscara não seriam recomendados, por aumentar o desconforto e por possivelmente causar maiores alterações fisiológicas e metabólicas que poderiam estar associadas ao risco de saúde, porém esta hipótese ainda deve ser testada.
Enfim, se deseja treinar sem a máscara e com menor risco de contaminação, o indicado é treinar em casa, ou em locais com mínima circulação de pessoas.
Referências
1. Chandrasekaran B, Fernandes S. “Exercise with facemask; Are we handling a devil’s sword?” – A physiological hypothesis. Med Hypotheses [Internet]. 2020;144:110002. Available from: https://doi.org/10.1016/j.mehy.2020.110002
2. Roberge RJ, Kim JH, Benson SM. Absence of consequential changes in physiological, thermal and subjective responses from wearing a surgical mask. Respir Physiol Neurobiol [Internet]. 2012;181(1):29–35. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/j.resp.2012.01.010
3. Kim JH, Benson SM, Roberge RJ. Pulmonary and heart rate responses to wearing N95 filtering facepiece respirators. Am J Infect Control [Internet]. 2013;41(1):24–7. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/j.ajic.2012.02.037
4. Person E, Lemercier C, Royer A, Reychler G. Effect of a surgical mask on six minute walking distance. Rev Mal Respir [Internet]. 2018;35(3):264–8. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/j.rmr.2017.01.010
5. Epstein D, Korytny A, Isenberg Y, Marcusohn E, Zukermann R, Bishop B, et al. Return to training in the COVID‐19 era: The physiological effects of face masks during exercise. Scand J Med Sci Sports. 2020;
6. Greenhalgh T, Dijkstra P, Jones N, Bowley J. Exercising and face masks: An important hypothesis buried in a selective review. Med Hypotheses [Internet]. 2020;144:110255. Available from: https://doi.org/10.1016/j.mehy.2020.110255