10 coisas que um técnico esportivo NÃO DEVE fazer – Parte 3



Esse é a nossa terceira postagem sobre 10 coisas que os técnicos não devem fazer. Se você não viu as outras matérias dá uma olhada na primeira (CLIQUE AQUI) e na segunda (CLIQUE AQUI).

Na matéria de hoje abordamos a o tema da especialização precoce e do controle e avaliação do desenvolvimento esportivo.

5 – Especializar precocemente

Esse é um tópico que todos têm consciência, porém na prática é algo ainda presente. Especialização precoce é se dedicar exclusivamente a uma só modalidade precocemente, participando efetivamente de competições, tendo uma alta carga de treinamento, além de uma alta demanda psicológica, como ter a pressão de ter que vencer (1). Obviamente essa prática pode desencadear vários problemas. Segundo Malina (2010) alguns dos riscos incluem (2):

Isolamento social: Devido a alta carga-horária de treinamento a criança tem que se dedicar quase que exclusivamente para os treinos, e naturalmente acaba se afastando de outros meios sociais;

Excesso de dependência: Em geral a vida de uma criança atleta tende a ser altamente regulada e isso pode desenvolver um excesso de dependência, e muitas vezes uma perda de controle das situações que ocorrem na vida;

Burnout: Burnout é o stress psicológico, onde o atleta chega um ponto que não aguenta mais os treinamentos, as competições e os outros componentes da vida de um atleta. Um criança chega nesse ponto devido à todas as pressões que ela recebe, seja do técnico, dos pais etc. Chega uma hora que a criança ou adolescente não aguenta mais competir, e muitas vezes jamais volta pra essa molidade esportiva.

Manipulação: Ser criança e atleta envolver ser regulado por um mundo de adultos, e em certa maneira manipulado e isso pode acarretar sérios problemas, como por exemplo a manipulação do peso em esportes como Judô, ou ginástica, podendo causar distúrbios alimentares. Há também a manipulação química, como drogas para melhorar a performance entre outros. E ainda a manipulação de média e marketing, onde a imagem do atleta é vendida como se fosse um produto, além de diversos outros exemplos. São fatores que podem influenciar negativamente a vida adulta desda criança, levando a desenvolver vários problemas.

Lesões: As sobrecargas de treinamento em um organismo que ainda estão em desenvolvimento devem ser muito bem controladas, o risco de lesões sérias acontecerem quando um atleta é especializado precocemente é muito alto. Sendo que tem muito talentos do esporte, que não chegam no alto nível, porquê sofreram uma lesão série e pararam de treinar.

Comprometimento do crescimento e maturação: Assim como ocorrem as lesões, há ainda outros comprometimentos à longo prazo com relação ao crescimento e maturação, como alterações no sistema hormonal.

Especializar precocemente é garantia de resultados?

De maneira geral, não há resultados consistentes pra afirmar que a especialização precoce fornece alguma vantagem pra esses atletas  (3). Porém modalidades como patinação artísticas, ginástica rítmica, ginástica artística e saltos ornamentais, podem requerir uma especialização mais precoce pois o pico de performance ocorre antes da total maturação física (4).

Sendo assim, pensando no desenvolvimento do atleta de maneira saudável, alguns modelos de formação a longo prazo surgiram. Segundo o Comitê Olímpico dos Estados Unidos há cinco estágios para a formação de atletas (5), são eles:

  1. Descobrir, aprender e jogar (0 aos 12 anos);
  2. Desenvolver e desafiar (10 aos 16 anos);
  3. Treinar e competir (13 aos 19 anos);
  4. Excelência para alta performance/ Participar e ser bem sucedido (Acima dos 15 anos);
  5. Prosperar e ser um mentor (para a vida toda);

Este conteúdo de especialização precoce é muito mais abrangente do que abordamos aqui, mas é importante refletir nossas práticas, principalmente pois apenas uma fração mínima de todos os atletas que iniciam no esporte irão chegar ao alto rendimento, então além da formação para a performance, nós como professores formamos para a vida.

6 – Não controlar e/ou avaliar o desenvolvimento

Nós já falamos sobre a importância de planejar o treinamento (CLIQUE AQUI), porém nada adianta o planejamento sem o controle e manutenção dos treinamentos. É igual no ano novo, todos planejam muitas coisas, essa é a parte mais fácil, porém a aplicação de tudo aquilo que planejamos que é a grande “sacada”. Aqui nós vamos abordar como o controle do desenvolvimento esportivo, é fundamental para a maior eficiência dos treinamentos.

Primeiramente é importante entender que é importante medir o desenvolvimento esportivo, seja de uma equipe ou atleta, pare saber o que o treinamento está causando. Seja na parte técnica, física, psicológica ou tática. Muitas alterações ao longo do processo são facilmente identificáveis, mesmo sem nenhum teste específico, porém há ainda muitas outras que não são tão evidentes (6,7).

Para determinar como ou qual teste será utilizado é importante verificar a validade e confiabilidade deste teste. Validade é se o teste fornece informaçao relevante a variável procurada, por exemplo para determinar a força no supino, se realiza um teste de repetição máxima no supino. Confiabilidade é a consistência do teste,  por exemplo, para saber o peso corporal sobe-se em uma balança, em teoria se o sujeito pesar-se várias vezes na sequência, o peso deveria ser sempre igual (8).

Há talvez um receio de muitos técnicos quanto a utilização de testes, pois muitas vezes tomam bastante tempo nas temporadas. Uma estrátégia ótima, é avaliar durante o treinamento, ou seja, pensar em meios e estratégias que seja possível avaliar no ambiente esportivo. Sendo que, muitas vezes testes realizados em sessões regulares de treino possuem maior validade, além da otimização do tempo (6).

Para o controle técnico e tático, a utilização de filmagens podem ajudar muito, onde o técnico, pode filmar os treinamentos e/ou jogos, e posteriormente realizar uma análise, dessa maneira não “perdendo tempo” em montar um teste específico, há na literatura, diversos artigos que buscam promover esses métodos de avaliação. Como por exemplo o sistema VIS (Volleyball Informational System) da Federação Internacional de Vôlei, que leva em consideração os pontos feitos, os erros, ou as bolas que apenas deram sequência no jogo(9).

Para o controle do desenvolvimento da força na sala de musculação, também existem meios de estimar a repetição máxima sem ter que fazer uma sessão específica para testes. Um método relativamente novo e com boa validade e confiabilidade, usa a percepção subjetiva de esforço (PSE) (Explicamos isso AQUI) com relação ao número de repetições em reserva para estimar percentuais de força máxima. Ou seja, uma PSE de 10 quer dizer esforço máximo, onde não seria possível realizar mais nenhuma repetição, uma escala 9 seria possível realizar pelo menos mais uma repetição, uma escala 8 pelo menos mais duas repetições e assim por diante (10,11). Por exemplo, o atleta realizou 6 repetições no supino com 60 quilos, este atleta relatou uma PSE de 8, ou seja quisesse conseguiria fazer mais duas repetições. Com essas informações é possível estimar a carga máxima e carga daquela série. Então vamos lá, olhando na tabela abaixo, temos que cruzar a informação da PSE (RPE na tabela) com  o número de repetições. Cruzando o 8 (PSE) com o 6 (repetições), ó possível observar que 60kg representa 79% da carga máxima. Usando regra de três básica nós conseguimos descobrir que a carga máxima estimada é aproximadamente 76kg.

A ainda outras variações da escala, porém, em uma próxima matéria nós iremos abordar especificamente este tema e aí sim explicaremos as diversas possíveis variações quanto o tipo de treino (força, potência, hipertrofia e resistência).

Muitas vezes  os técnicos se propoem a realizar vários testes, tendo uma série de dados, porém muiitos desses dados não tem aplicação prática. Onde ao mesmo tempo é fundamental medir, mas medir em demasia não faz nenhum sentido do ponto de vista prática. Talvez hoje esse seja o grande desafio, há novas tecnologias relacionadas ao controle de carga, que geram informação quanto à vários componentes, o técnico tem que ter ciência do que é realmente importante e como esses dados serão utilizados para melhorar a performance e os treinamentos da equipe, pelo contrário não há sentido em medir.

E acabamos assim mais um episódio da nossa série sobre 10 coisas que os técnicos esportivos não devem fazer! Fique ligado e não perca as outras matérias.

Não deixe ninguém te enganar!

#SciTraining

Referências

1.          Myer GD, Jayanthi N, Difiori JP, Faigenbaum AD, Kiefer AW, Logerstedt D, et al. Sport Specialization, Part I: Does Early Sports Specialization Increase Negative Outcomes and Reduce the Opportunity for Success in Young Athletes? Sports Health. 2015;7(5):437–42.

2.          Malina RM. Early sport specialization: Roots, effectiveness, risks. Curr Sports Med Rep. 2010;9(6):364–71.

3.          Jayanthi N, Pinkham C, Dugas L, Patrick B, LaBella C. Sports Specialization in Young Athletes: Evidence-Based Recommendations. Sports Health. 2013;5(3):251–7.

4.          Brenner JS, LaBella CR, Brooks MA, Diamond A, Hennrikus W, Weiss Kelly AK, et al. Sports specialization and intensive training in young athletes. Pediatrics. 2016;138(3).

5.          USA T. American Development Model [Internet]. 1. 2020. p. 1. Available from: https://www.teamusa.org/About-the-USOPC/Programs/Coaching-Education/American-Development-Model

6.          Thornton HR, Delaney JA, Duthie GM, Dascombe BJ. Developing Athlete Monitoring Systems in Team-Sports: Data Analysis and Visualization. Int J Sports Physiol Perform. 2019;1(14(6)):698–705.

7.          Foster C, Rodriguez-Marroyo JA, Koning JJ. Monitoring Training Loads: The Past, the Present, and the Future. Int J Sports Physiol Perform. 2017;Apr 12(2).

8.          Thomas JR, Nelson JK, Silverman SJ. Research Methods in Physical Activity. 7th ed. United States: Human Kinetics; 2015. 790 p.

9.          FIVB FI de V. VIS – FIVB [Internet]. 2020. p. 1. Available from: https://www.fivb.com/en/volleyball/vis

10.        Helms ER, Cronin J, Storey A, Zourdos MC. Application of the Repetitions in Reserve-Based Rating of Perceived Exertion Scale for Resistance Training. Strength Cond J. 2016;38(4):42–9.

11.        Zourdos M, Klemp A, Dolan C, Quiles J, Schau K, Jo E, et al. NOVEL RESISTANCE TRAINING–SPECIFIC RATING OF PERCEIVED EXERTION SCALE MEASURING REPETITIONS IN RESERVE. J Strength Cond Res. 2015;30(1):267–75.

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